quinta-feira, 6 de janeiro de 2022

Uma dor compartilhada



Me relutei por anos em assistir "My Mad Fat Diary".

Eu não conheci a série por indicação. Nem por propaganda antes do vídeo.
Eu a conheci por acaso, como muitas coisas na minha vida.

Eu relutei.
Por que?
Talvez pela falta de tempo?
Pelo streaming?
Ou por ser mainstream?

Eu não tenho uma resposta para isso.
Eu simplesmente não tenho.

Eu poderia ter acompanhado a série antes? Sim.
Eu poderia ter acompanhado os episódios semanalmente? Sim.
Eu poderia ter gastrite esperando a próxima temporada? Sim.

Mas... ainda bem que foi assim.

Sou assim: quando começo algo, quero terminar o mais rápido possível.
– pelo menos com séries, filmes ou novelas.
as outras coisas podem se arrastar.

E foi assim que virei a madrugada assistindo dezesseis episódios de MMFD.
E chorando.

Foram dezesseis episódios assistidos e inúmeras crises de choro.

Cada palavra, cada frase, cada diálogo, cada dúvida, cada medo, cada dor, cada momento vivido pela Rae foi compartilhado por mim.

Dúvidas, medos, angústias, cobranças, quedas, crises.
É tudo isso.
E mais.

A maior das dúvidas:
"Por que ele está comigo?"

É difícil entender como alguém consegue, e permitir que esse alguém me ame, se eu não consigo me amar.

Cada episódio me fazia entrar em um lugar escuro, que nunca consegui entrar na terapia.
Cada episódio me fazia olhar pra dentro  de mim, e buscar ali, no meio daquela bagunça, um pedaço perdido ou quebrado, que restou do que eu destruí.

Doeu me reconhecer ali.
Era eu, escrita.

Chorei muito em 48h. 
Chorei dos meus olhos não aguentarem o peso das lágrimas e elas começarem a cair sem controle.
Chorei sentindo o gosto salgado da lágrima. 
Chorei de soluçar no banheiro.
Chorei em silêncio de madrugada na cama.
Chorei muito.
Eu precisava chorar.

Me olhei no espelho muitas vezes.
Mas no meu rosto.
Olhos inchados e vermelhos.

Cada traço do meu corpo, cada pinta, cada mancha, cada pelo, cada tom, cada estria, cada quilo, cada curva.
Eu odeio cada detalhe em mim.

Nem todos, mas muitos.

E dói.

Dói ver olhares de nojo, olhares de desprezo, olhares de exclusão.
Dói ouvir comentários estúpidos e maldosos, que machucam e não mudam nada.
Dói.
Uma dor que carrego há anos, e que em 2009 foi difícil de suportar.

Eu tenho cicatrizes pequenas, e não tenho força nos pulsos.
Isso já diz muito sobre o que aconteceu.
Eu me senti fraca. Eu me senti um nada.
Eu achei que não iria aguentar, mas eu aguentei.
Por mim, e por mais ninguém.

Me arrependo do que fiz.
Todos os dias.
Mas tudo bem.

Talvez eu deva escrever um DIÁRIO GORDO como a Rae. 
Talvez eu deva colocar tudo pra fora, do meu jeito, e só pra mim. Talvez eu deva surtar e sumir. 

Mas, talvez mesmo, eu deva tentar.

Tentar seguir em frente, mais uma vez, por mim.

Eu não tenho faculdade para ir, nem amigos com quem repartir algo – a pandemia me afastou deles –, nem uma perspectiva de algo grande, e meu trabalho tedioso volta a ser minha rotina nos próximos dias, mas eu quero ser e fazer como Rachel: ser forte, e seguir em frente.

Eu preciso conseguir me abraçar.
Os meus medos, os meus traumas, as minhas dores, as minhas inseguranças, os meus questionamentos, as minhas escolhas... Tudo é meu. Tudo faz parte de quem eu sou, de quem fui um dia, e de quem um dia irei ser.
E só eu posso e devo lidar com isso.

Não consigo permitir que me abracem, porque eu mesma não consigo me abraçar.
Assim como a Rae, é difícil me despir também.
Me despir das roupas, das máscaras que uso, das risadas escandalosas que dou para abafar a vontade de chorar, e do personagem que criei.

A verdade é que eu não sou forte.
Dizem que eu sou, mas não sou nem um pouco.
– ou talvez eu seja, porque quero que acreditem que sou.

Mas dói.
Tudo dói.
E eu choro.
Eu só quero ser abraçada.
Eu só quero conseguir permitir ser amada de novo, e amar.

O que vale a vida sem amor?
O que vale a vida sem um amor?
O que vale a vida sem meu amor?

Uma meta para 2022?
Aprender a me amar.
E me despedir.
Me permitir.
Me redescobrir.

Como a Rae. ❤




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